quarta-feira, 7 de setembro de 2011

Os desafios da Contabilidade do Setor Público: Patrimônio e Accountability

Um dos grandes equívocos na Contabilidade Aplicada ao Setor Público em sua linha do tempo foi o esquecimento e a falta de enfatização do patrimônio, em especial do patrimônio público, emitindo-se relatórios contábeis inconsistentes e muitas vezes omissos pela falta do registro correto, não atingindo seu principal objetivo que é o subsídio à tomada de decisões pelo gestor.


Sabe-se que a Contabilidade é a ciência que estuda, registra, analisa e demonstra o seu objeto principal que é o Patrimônio, o que no ramo da administração pública, tudo isto foi um pouco esquecido.

Ao comparar as datas dos atos legais que deram definições iniciais à contabilidade das sociedades anônimas: Lei 6.404 de 1976 e contabilidade aplicada ao setor público: Lei 4.320 de 1964 nota-se que uma é bastante anterior a outra, que por sinal foi publicada em plena época da ditadura militar num período conturbado politicamente em fase de transição entre o Presidente João Goulart e Castelo Branco.

Uma das diferenças que deve ser lembrada entre a contabilidade geral e o seu ramo especializado do setor público é justamente a distinção entre os seus objetivos. Enquanto a primeira visa geralmente o lucro econômico para ser distribuído entre os sócios e acionistas, no setor público visa-se o atendimento às demandas sociais, que são muitas.

Com a abertura recente do comércio exterior e o grande volume de negócios internacionais realizados por conta da globalização da economia, o Brasil obrigatoriamente para manter-se alinhado aos outros países produtivos e competitivos, está se adaptando às normais internacionais de contabilidade, tendo como ações iniciais a criação do Comitê Gestor de Convergência e do CPC – Comitê de Pronunciamentos Contábeis e a edição da Lei nº 11.638 de 2007 que trouxe importantes alterações na Lei 6.404/76.

O CFC – Conselho Federal de Contabilidade e o IBRACON – Instituto Brasileiro de Contabilidade, identificaram a necessidade de estender e ampliar ações, notadamente às áreas de Auditoria e da Contabilidade do Setor Público.


A Portaria nº 184 de 26 de agosto de 2008 da Secretaria do Tesouro Nacional veio dispor sobre novas diretrizes a serem observadas pelos entes públicos quanto às práticas contábeis, de forma a torná-las convergentes com as Normas Internacionais de Contabilidade Aplicadas ao Setor Público.

Destaca-se como a mais revolucionária alteração, justamente a consagração e adoção definitiva do regime de competência, que por muitos anos foi erroneamente confundida e mal interpretada tomando-se por conceito a aplicação do regime misto, ou seja, o regime de caixa para as receitas e o regime de competência para as despesas, baseando-se no artigo 35 da Lei nº 4.320/64, referindo-se aos fatos orçamentários e não aos patrimoniais.

“Uma das características do modelo contábil-público brasileiro é o de desprezar o regime de competência de exercícios e de não reconhecer os ativos tangíveis e intangíveis. A portaria viabiliza uma correta avaliação e gestão das finanças públicas. O distanciamento até então existente com o modelo de contabilidade praticado no setor privado, levava a sérias distorções, criando desequilíbrios, especialmente no tocante às contas da previdência pública (TREVISAN, 2008).

A NBCT 16.10, veio tratar especificamente da Avaliação e Mensuração de Ativos e Passivos. Esta norma, além de estabelecer critérios e procedimentos para a avaliação e a mensuração de ativos e passivos integrantes do patrimônio, prioriza a inclusão dos bens de uso comum no grupo do Ativo Imobilizado, que atualmente não são incorporados. Para maior esclarecimento, podemos reportar ao Artigo 99 do Código Civil: Bens de uso comum do povo são as coisas públicas, isto é, utilizável por todos como, por exemplo: ruas, praças, pontes, estradas, rios etc.

Atualmente, torna-se impossível e inviável a extração de dados contábeis para uma apuração de valores para aplicação e levantamento de custos das empresas do setor público, justificada pela falta de adoção da contabilidade patrimonialista e o excesso de zelo com a contabilidade orçamentista, não que esta não seja menos importante.

De acordo com o IFAC – International Federation of Accountants, órgão contratado pelo CFC para a convergência das normas brasileiras de contabilidade do setor público, representada por IAN BALL, chefe do escritório executivo, o primeiro governo a introduzir o regime de competência foi a Nova Zelândia, e que tiveram bastante desafios e disposição para realizar a mudança, uma vez que não havia uma Constituição escrita e apenas uma Lei de Responsabilidade Fiscal que fora introduzida em 1994. Ressaltou ainda, que foram contratados diversos contadores com a meta de implantação da contabilidade patrimonial em dois anos, se estes não conseguissem seriam demitidos.

Já Ian Carruther, diretor Técnico e de Política do Instituto de Finanças e Contabilidade Pública do Reino Unido, país que está em fase de implantação das NICs – Normas Internacionais de Contabilidade, pautou que o processo foi também bastante complicado em seu país, com o desafio de não aceitação de diversos técnicos da área, comentou ainda que foi realizado um concurso com prêmios para os órgãos públicos que implantassem em menor tempo.

Com toda discussão internacional sob a contabilidade aplicada ao setor público, a palavra accountability muito utilizada nas empresas mercantis veio à tona também na área pública, que traduzida por LIMA e CASTRO é a obrigação, por parte dos que detêm poder de Estado, de prestar contas e assumir responsabilidade perante os cidadãos. Não se limita à prestação de contas, mas, sobretudo, à definição do objeto a prestar contas. “Tem por objetivo oferecer transparência e, como conseqüência, criar condições de confiança entre governante e governado.”